O Poder Judiciário tem entendido que é faculdade da Administração Tributária reabrir o prazo de pagamento do imposto vencido, não podendo o Poder Judiciário determinar a prorrogação do vencimento do ICMS de empresas atingidas pela pandemia do COVID-19.
Nesse contexto, e considerando que até o momento não existe qualquer medida que reduza a carga tributária, ou ao menos prorrogue o pagamento dos impostos estaduais, e que a necessidade de fluxo de caixa é imediata, todos os cenários e estratégias que oportunizem a redução ou recuperação de tributos devem ser analisados.
Neste post, quero trazer uma questão que tenho trabalhado com os meus clientes: revisão de parcelamento e repetição de indébito tributário.
No Estado de São Paulo, o DECRETO Nº 64.564, DE 05 DE NOVEMBRO DE 2019 instituiu o Programa Especial de Parcelamento - PEP do ICMS para a liquidação de débitos fiscais relacionados com o ICMS e diversos contribuintes aderiram a este parcelamento para sanar suas pendências.
Sabemos que, quanto aos aspectos fáticos sobre os quais incide a norma tributária, a regra é que não se pode rever judicialmente a confissão de dívida efetuada com o escopo de obter parcelamento de débitos tributários. Mas, a matéria de fato
constante de confissão de dívida pode ser invalidada quando ocorre defeito
causador de nulidade do ato jurídico, o que não inibe o questionamento judicial da obrigação tributária, no que se refere aos seus aspectos jurídicos (REsp 1.133.027/SP, Tema 375).
De fato, até 2017 o Estado de SP previa a incidência de juros de 0,13% ao dia sobre o valor do tributo devido,conforme dispõe o artigo 96 da Lei n.º 6.374/1989 – alterado pelo artigo 11, XIV da Lei n.º 13.918/2009.
Em 2017, a Lei Estadual 16.497 alterou a redação do referido artigo afastando a incidência de juros moratórios superiores à Selic.
Ou seja, para todas as CDA's referentes a créditos anteriores a esta lei devem ser elaborados novos cálculos, com a consequente emissão de CDA's substitutivas.
Além dos juros, temos os acréscimos financeiros. O art. 100 da Lei 6.374/89, com redação dada pela Lei 13.918/09, estabelece:
Artigo 100 - Os débitos fiscais podem ser recolhidos parceladamente
respeitadas as seguintes condições, sem prejuízo de outras
estabelecidas pelo Poder Executivo:
(...)
§ 3º - Consolidado o débito fiscal, o valor total e o de cada parcela
poderão ser expressos em UFESPs, e sobre esse montante incidirá
acréscimo financeiro sempre superior ao praticado no mercado,
fixado por ato do Secretário da Fazenda.
(...)
§ 7º - Ato do Secretário da Fazenda disciplinará os acréscimos
financeiros, sempre superiores aos praticados no mercado,
aplicáveis ao recolhimento de parcelas em atraso.
Na Arguição de Inconstitucionalidade nº 0016136-82.2017.8.26.0000, o C.
Órgão Especial “reconheceu a incompatibilidade da expressão 'sempre superior ao
praticado no mercado', constante no § 3º, bem como da expressão 'sempre
superiores aos praticados no mercado', consignada no § 7º, do artigo 100 da Lei
Estadual nº 6.374/1989, com a redação conferida pela Lei nº 13.918/2009, com os
artigos arts. 5º, LIV, 24, I, e 150, IV, da Constituição Federal, e artigo 111, da
Constituição Estadual”.
Entendeu-se que os acréscimos financeiros NÃO podem ser superiores
àqueles incidentes em parcelamento de tributos federais (SELIC).
Além disso, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) decidiu na noite desta quarta-feira, 17, por unanimidade, reduzir a Selic (a taxa básica da economia) em 0,75 ponto porcentual, de 3,00% para 2,25% ao ano.
O Decreto 64.564/19, que instituiu o Programa Especial de Parcelamento - PEP do
ICMS, dispõe:
Artigo 1º (...)
II - em até 60 (sessenta) parcelas mensais e consecutivas, com redução
de 50% (cinquenta por cento) do valor atualizado das multas punitiva e
moratória e 40% (quarenta por cento) do valor dos juros incidentes
sobre o imposto e sobre a multa punitiva, sendo que na liquidação em:
(...)
c) 31 (trinta e um) a 60 (sessenta) parcelas, incidirão acréscimos
financeiros de 1% (um por cento) ao mês.
Isto representa acréscimos financeiros a 1% a.m., 12% a.a., portanto, muito
superiores à SELIC.
Essa cobrança é abusiva e ilegal.
Todos os contribuintes que parcelaram débitos com as Fazendas Estaduais dos seus Estados, calculados com juros e acréscimos financeiros superiores à taxa Selic, devem pleitear a revisão do parcelamento, bem como repetição do indébito tributário.
Questões estratégicas: o pedido não deve ser para suspender a exigibilidade do débito, tendo em vista ser inócuo, já que o crédito tributário está com a exigibilidade suspensa por expressa previsão legal e em relação às obrigações tributárias já recolhidas, o pedido será para autorizar a repetição do indébito tributário via restituição em dinheiro ou compensação administrativa.
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Deixem dúvidas e comentários.
Um abraço!
Fernanda Dias Nogueira – advogada tributarista, especialista em Gestão de Tributos e Planejamento Tributário pela FGV/SP, sócia do escritório Machado Nogueira Advogados, Podcaster “Em pauta, com Fernanda Nogueira” e autora do blog “Tributário na prática”.
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