Como extinguir execuções fiscais contra os sócios de empresas devedoras?
Se ficar comprovado que não houve o respeito ao contraditório e ampla defesa no processo administrativo tributário.
Entenda.
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“A inclusão do sócio como corresponsável na CDA depende da sua notificação no procedimento administrativo, para possibilitar o contraditório e a ampla defesa, o que não ocorreu nas ações fiscais administrativas supracitadas. Como visto, todo o procedimento administrativo para a apuração do crédito foi direcionado unicamente contra a pessoa jurídica, sem qualquer notificação ou participação dos sócios agravados-executados.
Contudo, para que sejam demonstradas as circunstâncias autorizadoras da imputação de responsabilidade patrimonial dos sócios descritas no art. 135 do CTN, é necessário que eles participem, com a observância do devido processo administrativo, art. 5º, inc. LV, da CF, no qual deve ser apurada a ocorrência de alguma daquelas hipóteses.
Dessa forma, se os sócios da empresa executada não foram mencionados no processo administrativo fiscal e tampouco cientificados para se defenderem, não poderiam ser incluídos nas CDAs como coobrigados pelo crédito tributário. Deve, pois, ser considerada nula a inclusão dos sócios nas Certidões de Dívida Ativa, porquanto foi realizada sem a comprovação de qualquer conduta fraudulenta e, principalmente, sem possibilitar aos sócios o contraditório e a ampla defesa.
Os requisitos exigidos para a constituição da Certidão de Dívida Ativa são os previstos no art. 2º, §§ 5º e 6º, da Lei 6.830/80. A indicação, na CDA, dos nomes dos responsáveis deve ser compreendida como a faculdade, conferida à Fazenda Pública, de inclusão de todos os sujeitos responsáveis pelo recolhimento do tributo. E, diante dessa faculdade, depende-se, para a inclusão dos sócios na CDA, da comprovação, pela Fazenda Pública, das hipóteses do art. 135 do CTN e oportunização do contraditório e da ampla defesa.
A Certidão de Dívida Ativa goza de presunção de liquidez e certeza, no entanto, por ser relativa, referida presunção pode ser desconstituída mediante produção de prova capaz de apontar irregularidades no título. Desse modo, não facultada a defesa dos sócios mediante o devido processo administrativo fiscal, a presunção de legalidade do título executivo é infirmada e ressai a ilegitimidade passiva dos sócios para figurar nas CDAs e, por conseguinte, nos autos da execução fiscal, conclusão que não contraria o art. 3º da Lei 6.830/80 e o art. 204 do CTN.
O eg. STJ, no julgamento repetitivo do REsp 1.101.728/SP (Tema 97) estabeleceu que "a simples falta de pagamento do tributo não configura, por si só, nem em tese, circunstância que acarreta a responsabilidade subsidiária do sócio, prevista no art. 135 do CTN. É indispensável, para tanto, que tenha agido com excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato social ou ao estatuto da empresa".
É também o que estatui a Súmula 430 do eg. STJ, in verbis:
"O inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente."
Diante dos fundamentos acima expostos, os sócios não poderiam constar das CDAs, matéria que, reitere-se, pode ser analisada na exceção de pré-executividade, uma vez que prescinde de dilação probatória, por estar comprovada a inexistência de notificação dos sócios para se defenderem no processo administrativo.
Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados deste TJDFT, in verbis:
"TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. INTERRUPÇÃO. PRAZO PRESCRICIONAL. PARCELAMENTO. PEDIDO DO DEVEDOR. ÔNUS DA PROVA. FAZENDA PÚBLICA. INCLUSÃO SÓCIO-GERENTE. CDA. PROCESSO ADMINISTRATIVO PRÉVIO. NECESSIDADE.
[...]
6. A inclusão do nome do sócio como corresponsável tributário na certidão de dívida ativa (CDA) deve ser precedida pelo exercício do contraditório e da ampla defesa no procedimento administrativo fiscal, sob pena de elidir a presunção de certeza e liquidez da CDA, nos termos estabelecidos pelo Superior Tribunal de Justiça quando do julgamento do REsp 1104900/ES, submetido à sistemática da análise de recursos repetitivos.
7. Recurso conhecido e desprovido." (Acórdão 1332360, 07211181020198070016, Relator: MARIA DE LOURDES ABREU, 3a Turma Cível, data de julgamento: 7/4/2021, publicado no DJE: 26/4/2021.
Pág.: Sem Página Cadastrada.)
"DIREITO TRIBUTÁRIO. REEXAME NECESSÁRIO. INSCRIÇÃO CDA. NECESSIDADE DE INTIMAÇÃO DOS SÓCIOS. CERCEAMENTO DE DEFESA.
1. O reconhecimento da presunção de legitimidade da CDA deve estar atrelado à existência de procedimento administrativo de apuração da responsabilidade do sócio, com amplo exercício do contraditório e da ampla defesa.
2. A notificação da pessoa jurídica não supre a intimação pessoal dos sócios também mencionados na Certidão de Dívida Ativa.
3. Reexame necessário desprovido." (Acórdão 1239103, 07038832420198070018, Relator:
MARIO-ZAM BELMIRO, 8a Turma Cível, data de julgamento: 18/3/2020, publicado no PJe:
9/4/2020. Pág.: Sem Página Cadastrada.)
"EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. DEFERIMENTO DE GRATUIDADE DE JUSTIÇA. DESNECESSIDADE DE GARANTIA DO JUÍZO. AUSÊNCIA DE JULGAMENTO EXTRA PETITA. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. NÃO ADSTRIÇÃO AOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS APRESENTADOS PELAS PARTES. INCLUSÃO INDEVIDA DE NOME DE SÓCIO NA CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA. AUSÊNCIA DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO CORRESPONSÁVEL CONFIGURADA. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA NÃO OPORTUNIZADOS.
[...]
3. O reconhecimento da presunção de legitimidade da CDA está atrelado à presunção de que houve regular processo ou procedimento administrativo de apuração da responsabilidade do sócio, cujo nome figura na CDA, na forma do art. 135 do Código Tributário Nacional.
4. O fato de o nome do sócio constar na Certidão de Dívida Ativa (CDA) não autoriza seu ingresso automático no polo passivo da Execução Fiscal, se não restou demonstrado no processo administrativo que originou a CDA que ele agiu com excesso de mandato ou com infração à lei. Isto porque, não se pode presumir a legitimidade do lançamento, se este não foi precedido do indispensável procedimento administrativo de apuração de responsabilidade do sócio por tributo devido pela sociedade.
5. O mero inadimplemento do débito tributário não é suficiente para redirecionar a responsabilidade ao sócio-gerente, conforme de depreende do enunciado da Súmula 430 do STJ.
6. Recurso conhecido e desprovido." (Acórdão 1039078, 20140110657529APC, Relator: CARLOS RODRIGUES, 6a TURMA CÍVEL, data de julgamento: 2/8/2017, publicado no DJE: 22/8/2017. Pág.: 647/690)
Registre-se que admitir que não seria necessário o contraditório no processo administrativo fiscal equivale a aceitar a inclusão automática dos sócios na CDA, em desrespeito ao art. 135 do CTN, que exige, para a responsabilização pessoal por dívida de terceiros, a prática de atos praticados com excesso de poder ou infração de lei, contrato social ou estatutos, atos ilícitos, portanto.
Assim, na esteira do entendimento do eg. STJ, frisando-se o direito à apresentação de defesa administrativa, "independentemente de a lei contemplar mais de um responsável pelo adimplemento de uma obrigação tributária, cabe ao Fisco, no ato de lançamento, identificar contra qual (is) sujeito (s) passivo (s) ele promoverá a cobrança do tributo, nos termos do art. 121 combinado com o art. 142, ambos do CTN, garantindo-se, assim, ao (s) devedor (es) imputado (s) o direito à apresentação de defesa administrativa contra a constituição do crédito.
Por essa razão, não é permitido substituir a CDA para alterar o polo passivo da execução contra quem não foi dada oportunidade de impugnar o lançamento, sob pena de violação aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, também assegurados constitucionalmente perante a instância administrativa" (EREsp n. 1.115.649/SP, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 27/10/2010, DJe de 8/11/2010.)
Em conclusão, é incabível o redirecionamento da execução fiscal contra os sócios da devedora principal que não participaram dos processos administrativos de constituição das dívidas, em violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa.
TJ-DF 0743857-83.2023.8.07.0000 1816339, Relator: VERA ANDRIGHI, Data de Julgamento: 15/02/2024, 6ª Turma Cível, Data de Publicação: 05/03/2024)
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